texto de izabel xarru
Nem a alegria nem a tristeza vieram tagarelar aqui, com seu lencinho de prata. De longe, uma memória assoma: o medo é quem me reza . E o medo quase nunca é o que padece. Ou olhos afiados no trecho o benzem com armaduras e cisco pré-natal.
A última emoção foi no vestiário. Estávamos as quatro. Eu, uma inimiga (improvavelmente) tornada amiga e mais duas amigas. Uma delas assassinada no momento em que foi tomar o banho do outro lado. Quando chegamos a procurar, ela tinha a aparência de um rolo de sangue cinturado, cabelos na ponta. No mesmo ambiente. Não vimos nada, nem ouvimos. Ela só acabou. Assim: Fim. Ele ainda estava lá. Não teria por onde sair.
Nós saímos. Encontro as subidas em que os carros se tornam mais lentos, rua de terra, sensação de perigo. Queria correr, ir para longe, onde não pudesse ser vista ou suposta. Aquele homem pesava em meu corpo como um caminhão de ossos de museu, ainda escorrendo salitre dos músculos, muitos músculos. E me apodrecia as quilhas e navalhas.
Entro na casa em que eu passaria a morar em poucos dias. Ela ficava perto de muitas árvores em um bairro nobre, mas estava ligada pela minha vida ao vestiário que eu acabava de abandonar. Isso amarrou vespas nos meus tecidos, esfriando cada estação em uma mão que desce a coluna e quebra o cóccix.
É pior ler que as portas principais não estão lacradas. Nem os vidros.
E que, encostada em terra e mármore,
não há voz que me ouça o tranco.